domingo, maio 01, 2005

O que há em mim é sobretudo cansaço


















Não disto nem daquilo,
Nem sequer de tudo ou de nada:
Cansaço assim mesmo, ele mesmo,
Cansaço.

A subtileza das sensações inúteis,
As paixões violentas por coisa nenhuma,
Os amores intensos por o suposto em alguém,
Essas coisas todas –
Essas e o que falta nelas eternamente -;
Tudo isso faz um cansaço,
Este cansaço,
Cansaço.

Há sem dúvida quem ame o infinito,
Há sem dúvida quem deseje o impossível,
Há sem dúvida quem não queira nada –
Três tipos de idealistas, e eu nenhum deles:
Porque eu amo infinitamente o finito,
Porque eu desejo impossivelmente o possível,
Porque quero tudo, ou um pouco mais, se puder ser,
Ou até se não puder ser...
E o resultado?
Para eles a vida vivida ou sonhada,
Para eles o sonho sonhado ou vivido,
Para eles a média entre tudo e nada, isto é, isto...
Para mim só um grande, um profundo,
E, ah com que felicidade infecundo, cansaço,
Um supremíssimo cansaço,
Íssimno, íssimo, íssimo,
Cansaço...

Álvaro de Campos

3 Comments:

Blogger Madalena said...

Obrigada Ti!!!! Lindo este poema!
beijinho grande

11:29 da tarde  
Blogger Pitucha said...

E com isto concluo que a minha vida é um poema! Ou que eu vivo, neste momento, um poema! Um permanente e indizível cansaço, que me deixa, como Mário de sá Carneiro, muito aquém da brasa e do além.
Um beijo primita!

10:44 da manhã  
Blogger Formiga Rabiga said...

Estou como a Pitucha, a minha vida é um poema porque também ando cansada.
Cansaço é um estado que não devia existir, uma das provas de que a natureza não é perfeita.
Beijinhos.

12:27 da manhã  

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